"No futebol, matar a bola é um ato de amor. Se a bola não quica, mau-caráter indica. E ontem, segunda-feira soturna para alguns dos atletas ali postados em campo, alguns atletas passaram do limite humano da falta de amor e carinho pela bola. A bola não quicou diversas vezes, indicou mau-caráter de alguns peladeiros, uns do interior, uns da capital, outros ainda, lendas foclóricas personificadas. Além destes, o homem do apito, aquele que alguns chamam de 'autoridade', pecaram por ação, omissão ou comissão.
Por outro lado, orgulhou-me ver a classe, a técnica e a dedicação de peito aberto por parte de jogadores como Guy-René, o franjinha de ouro, de Marcelo, o Cardgay, do Enilton recifense, Paulo, e, mais uma vez encheu os olhos, o jogador que parece mais ter vindo de uma história de arqueiros, unicórnios, mestres e magos: o Presto. Este último, de pulmão incansável. De visão de jogo. De calma e serenidade que saltam aos olhos dos mais descontrolados dos bastardos. Aquele que mesmo na derrota do seu time, sai incólume, ileso de críticas e xingamentos. Não quero me prender agora na análise de um ou d`outro jogador apenas. Podemos então passar, linha por linha, palavra por palavra, atuação por atuação, de cada um destes guerreiros em noite de "quase" um só time, vencedor de grande parte das batalhas.
Paulo - este que atende pela alcunha infame de Delegado, por certas vezes, lembra-me o atacante peito de tábua, Enilton. Faz um gol aqui, outro ali, mas em sua maioria, mira a lua, acerta o refletor e faz com que a bola seja maltratada. Não parece amar a bola. Não sabe sequer matá-la. Mas até que foi produtivo.
Guy - garoto de ouro, que derretendo dá um anel. Utiliza-se de uma faixa para segurar sua franja escovada, esconde por trás dessa imagem fragilizada de menino mimado, um grande jogador, marcador e ultimamente, grande finalizador. Mostrou ontem que futebol também é para os de imagem delicada. Foi o Rambo de cabelo escovado da pelada:
Nota: As imagens deste vídeo não refletem exatamente nem o físico nem a masculinidade do jogador
Claudionor - lembro-me bem do Central que bateu o Flamengo em Caruaru pelo Campeonato Brasileiro de 1986 e vi naquela cidade agrestina a garra do homem nordestino. E não era contra qualquer Flamengo que jogavam. Ali era a casa de Zico. A bola é uma flor que nasce nos pés de Zico, com cheiro de gol. Mas ali em Caruaru havia Zé Carlos Macaé, campeão brasileiro no ano seguinte. Lateral forte e eficiente. Agora, leitores, esqueçam tudo aquilo que falei. Não é nada parecido com o caso do avaliado. Desleal, perdido como um bezerro do agreste desgarrado da boiada.
Romero - recebe o apelido carinhoso de alguns amigos de Rola. Ora, numa pelada que tem Rola, Pitoca, Pitoquinho e Pomba, este demonstra ser o de mais virilidade na hora das divididas. Não que tenha tirado prova, mas os nomes também falam. Foi decisivo na marcação ontem. No final, Rola fica mole e não consegue mais ser produtivo.
Marcelo - em sua economia de masculinidade, este atacante, por diversas vezes decisivo mostra que o que quer mesmo, é mudar, é voar, é ser livre. Anunciou 'troco dois pés em bom estado de conservação por um par de asas bem voadas'. Voa, Marcelo! Voa em direção ao templo maior do Peleja e marca lá os teus gols. Comemore como uma Ararinha de Plumas Douradas. Parabéns pela atuação de ontem!
André Curupira - inverte os pés para despistar o adversário, o caçador, o marcador. Ontem, com pés invertidos perdeu gols que nem sem pés poderiam ser perdidos. É daqueles que trata a bola com carinho, diferente das canelas e pés dos adversários. Deixou um pouco a desejar em sua atuação quase de gala, quando é de praxe beirando a perfeição futebolística.
André Melancia - Por diversas vezes é um mensageiro célere da zaga para o ataque, mas em outras, não parece tão certo de suas vontades de ligação para os flancos ou para o fronte de batalha. Atrasa algumas vezes o time, mas é importante pois tanto defende quanto ataca. E faz gols. Seja o gol mesmo, um estupro. Afinal, gol de letra é injúria; gol contra é incesto; gol de bico é estupro. Bico é forte dele. Não tem pra Diogenes.
Fábio 'Mané' Barba - Para Fábio 'Mané' Barba, o espaço de um pequeno guardanapo é um enorme latifúndio. E é assim que ele se sente em campo. Em um latifúndio, com todo o espaço do mundo de meio metro, driblando com facilidade quem estiver na sua frente. Além de chutar ambidestramente. Seria o craque do ano? Seria o craque? Seria? Será?
Igor - o pequeno gigante da zaga. Não tem Paulo Delegado que o intimide. Não tem dividida que não entre com o coração na ponta da chuteira. Não é desleal. É simples. É direto. Falha. Mas corrige. Temível e terrível não andam mais juntos. Acabou-se o complexo de Médico e Monstro. Parabéns por mais uma grande atuação, Temível.
Artur - Heróis são reféns da glória. Vivem sufocados pela tirania da alta performance. E é assim hoje o que acontece com este herói da bola. Carrega em sua bagagem os títulos de melhor do ano passado, de melhor blogueiro, de tumba, etc... E por isso está sempre sendo cobrado por atuações de gala. Ontem, por uma simples furada que arrancou um gomo da bola, foi chacotado. Mas e os gols? E chute no travessão de antes do meio campo? É nestes momentos que o quase-gol torna-se mais mágico e mais belo que o próprio. Parabéns, canino jogador.
Iretônio - Efetivo nos passes foi ontem o sempre taciturno professor. O professor medíocre conta. O bom professor explica. O professor superior demonstra. E ontem o professor demonstrou que evolui na arte do passe. Limpa as jogadas e entrega de bandeja aos seus discípulos.
Thiago Bambolê: Ontem, o Jesus Cristo do Peleja, foi um tanto inócuo. Ainda assim, mostrou que continua dominando a técnica do bom passe. Lançamentos que lembravam um certo Carlos Alberto. Mas claro, quem cuida de uma casa agora, não tem condições de cuidar mais do seu físico. Morreu!
Luis - não é um jogador supérfluo em sua função dentro de campo, porém supérfluas são suas reações diante da arbitragem. Entrega-se ao desespero. Entrega-se ao choro e perde a razão, juntamente com o jogo. Com a cabeça no lugar, joga sempre bem. Enquanto isso não acontece, deixa a desejar.
Hugo - Junto com seu ídolo Brasão, caiu de rendimento. Como um jogador loquaz em excesso, não produziu tanto, preocupando-se muito mais em desperdiçar palavras ao vento, já que o juiz é de grande boca, não de grandes orelhas (e ouvidos). Sabe que pode produzir mais, este columbiforme dos gramados.
Toré - De educação espartana nas barrinhas de prédio, tem o drible curto como principal arma, além de achar brecha entre 4 ou 5 jogadores para dar passes milimétricos aos companheiros. Em acordo tácito com um amigo de time, defendeu o bom futebol de forma discreta. Porém não foi discreta sua atuação, mesmo tendo chegado tarde. Grande atuação ontem, Gustavo, o Toré.
Presto - De temperamento fleumático, assim como é o seu futebol em campo. Frio. Tranquilo. Equilibrado. Não cansa. Não para de marcar. Falha algumas vezes? Sim, falha! Mas ali quem não falha? Mais uma grande atuação do ponto de equilíbrio entre o ataque e a defesa. Entre o certo e o errado. Entre o céu e a terra. Entre o branco e o preto. Entr...
Paro por aqui hoje. Paro aqui para sempre. Não deixarei de sentir este maravilhoso Peleja nunca. Agradeço sua existência, Peleja. Obrigado pela oportunidade de ter lido textos tão bons (exceto aquele de um tal Claudionor) sobre o futebol. Despeço-me saudosamente."
Por Armando Nogueira (psicografado)
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Há 5 anos